sábado, 30 de outubro de 2010

A superbactéria que contaminou 183 pessoas e matou 18 no Distrito Federal

os menos quatro unidades particulares do DF registram infecção pela KPC
Secretaria, no entanto, se recusa a divulgar a lista detalhada das unidades onde houve contaminações e mortes

A superbactéria que contaminou 183 pessoas e matou 18 no Distrito Federal se alastra também pelos hospitais particulares. Ao menos quatro unidades privadas admitiram a presença da Klebsiella pneumoniae carbapenemase (KPC). Nelas, houve o registro de 19 infecções e duas mortes, do total de casos anotados pela Secretaria de Saúde. Os problemas são os mesmos da rede pública: abuso de antibióticos e falhas com a higiene.

Sob a alegação de evitar pânico, a Secretaria de Saúde decidiu divulgar apenas os dados globais sobre a superbactéria, sem detalhar os casos por hospital. Mas isso não traz tranquilidade à população. Mãe de três filhos e prestes a dar à luz Vitor Hugo, a dona de casa Elma Pereira de Souza, 32 anos, questionou a ginecologista sobre os riscos de contrair a KPC. “O neném vai nascer nesta quarta-feira e estou preocupada. Quis saber como se pega essa bactéria e se corro algum risco. A ginecologista disse que o perigo é para quem está na UTI e com a imunidade baixa”, contou a gestante.

Na tarde de ontem, o empresário Luciano Ribeiro dos Santos, 38 anos, aguardava para visitar a avó de 72, internada na UTI de um hospital particular da Asa Norte. “Estamos preocupados com essa história de KPC, porque sabemos que ela pode ser contaminada”, comentou. Segundo ele, o controle dentro do hospital é rigoroso. “Mandam a gente lavar a mão com água, sabão e depois passar álcool. Funcionários ficam ao lado, orientando. Só então deixam entrar na UTI”, relatou.

Antibióticos

Especialistas afirmam que os profissionais de saúde também são responsáveis pelo surgimento de bactérias resistentes e que o surto no DF pode contribuir para o aprofundamento das discussões sobre as práticas nos hospitais públicos e privados. Presidente do Conselho Regional de Medicina (CRM-DF), Iran Augusto Gonçalves Cardoso diz que o medo de erro médico leva os profissionais a abusarem dos antibióticos. “Em alguns casos, os médicos temem o erro e acabam usando de cara um antibiótico quando não é necessário. Essa situação obrigará os profissionais a fazer um histórico melhor do paciente”, avalia.

Exames físicos e análise mais aprofundada dos sintomas podem evitar o excesso de medicação, segundo Iran Cardoso. O ideal, diz ele, é fazer exames laboratoriais sempre que um paciente apresenta sinais de infecção. “É preciso fazer a cultura de bactérias para se ver se há ou não processo infeccioso e descobrir por qual bactéria. Só então, inicia-se uma antibioticoterapia”, recomenda. O resultado da cultura pode demorar entre 48 horas e 72 horas.

O assédio da indústria farmacêutica sobre os médicos, assim como a automedicação, são apontadas pela infectologista-chefe do Hospital Daher, Luciana Teodoro Lara, como agravantes para o problema. “Às vezes, o médico prescreve um antibiótico superpotente para tratar uma dor de garganta. É como dar um tiro de canhão para matar mosquito. Um dos efeitos colaterais é a resistência adquirida pela bactéria”, afirma.

Mas, apesar de existirem falhas, Luciana Lara assegura que, na maioria das vezes, o uso do antibiótico no ambiente hospitalar é feito corretamente. “Quando há tempo hábil, o exame de cultura bacteriana detecta qual é o tipo de organismo responsável pela infecção e então a prescrição é feita exatamente para aquele caso, na dose e pelo tempo necessário”, explica. A direção do Daher informou que não há registros de KPC no hospital.

Treinamento

Amanhã, médicos da área de ginecologia e obstetrícia da Rede Brasília de Hospitais participarão de um workshop sobre o uso racional dos antibióticos. A direção não informou quantos casos foram registrados na rede — Hospital Brasília, Dr. Juscelino Kubitschek e Hospital das Clínicas de Brasília — sob a alegação de que os dados são sigilosos. A infectologista Maria de Lourdes Worisch Ferreira Lopes, da Rede Brasília de Hospitais, afirma que os funcionários receberam treinamento intensivo para lidar com infecções pela KPC e que as normas de higiene das instalações e das mãos de enfermeiros e médicos foram reforçadas.

Paciente diagnosticado com a enzima carbapenemase — que torna a bactéria resistente — é isolado dos demais, segundo Maria de Lourdes. “Para evitar abusos dos medicamentos para tratar dos pacientes com infecções, existe apoio diário da infectologia com discussão de todos os casos à beira de leito”, esclarece a médica. E, nesses hospitais particulares, pacientes vindos de outras unidades de saúde são submetidos a testes logo após a admissão.

Fonte: http://www.sindilegis.org.br/conteudo/texto.asp?tipo=NaImprensa&id=751500875575016731430001