sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Das promessas aos atos

as promessas aos atos

Foi preciso que se tornasse incontestável a perda da capacidade inovadora e da competitividade da indústria brasileira para o governo federal dar mais um passo à frente na implantação da sua política de desenvolvimento industrial e tecnológico, que tem sido extremamente lenta. Mas, antes tarde do que nunca.

As recentes medidas provisórias 495 e 497 estabeleceram o uso do poder de compra do Estado em favor dos produtos fabricados no país e o acesso das micro e pequenas empresas inovadoras aos incentivos fiscais previstos em lei.

A Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), lançada em 2004 e transformada em 2008 na Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), rendeu ao longo de 2009 alguns avanços pontuais, a exemplo da concepção do Complexo Industrial da Saúde.

Contudo, esse avanço ainda é muito pequeno diante do desequilíbrio econômico que se avoluma. As referidas MPs balizam a ação dos órgãos operacionais, mas, se não forem emitidos imediatamente atos normativos para determinar sua aplicação, as melhorias desejadas no perfil da produção brasileira não serão efetivadas.

Na área da química fina, que abriga as indústrias farmacêutica e de defensivos agrícolas, um meio simples de incentivar a inovação e a produção nacional seria os órgãos reguladores diretamente envolvidos, como a Anvisa e o INPI, adotarem uma “fila verde-amarela” para analisar com prioridade pedidos de registro sanitário e de patentes relativos a produtos desenvolvidos no país.

O sucesso de uma política industrial voltada para o desenvolvimento econômico demanda elevado grau de convergência e articulação nas ações administrativas de diferentes instâncias do Poder Executivo, bem como o envolvimento do Legislativo e do Judiciário, o que está longe de ocorrer no Brasil. Nosso poder público permanece atado a uma herança que hoje mais compromete do que estimula o desenvolvimento econômico e social: o “assembleísmo” e a descentralização exacerbada promovidos pela Constituição de 1988, explicáveis como reação ao período de exceção anteriormente vigente, bem como pela excessiva partidarização da máquina pública, porém contraproducentes sob a ótica da gestão.

Uma administração pública que mereça este nome requer coordenação central forte, consistente nas decisões e eficaz no mon i t o r a m e n t o d a i mplantação das políticas públicas.

Entre as promessas e os atos, como também entre os projetos e sua implementação prática, há uma distância que o governo precisa encurtar, sob pena de ver malogradas as políticas sobre as quais construiu sua identidade eleitoral. A tendência crescente de déficit na balança comercial brasileira, decorrente da perda de valor agregado das exportações e do processo inverso nas importações, está muito longe de ser revertida, a despeito da PITCE e da PDP.

A edição das MPs 495 e 497 mostrou que o governo mantém seu compromisso com a PDP. Mas como no Brasil as leis têm que “pegar”, para deixarem de ser meros instrumentos de ficção, é indispensável uma rápida edição de regulamentos e instruções claras determinando às instâncias operacionais os procedimentos e critérios de aplicação.

Neste momento carecemos, apenas, de uma forte liderança legitimada pelas urnas para exercer com autoridade o poder central, articulando os agentes econômicos de forma a torná-los tão produtivos quanto o país precisa para atingir um crescimento sustentável.

A tendência de déficit na balança comercial brasileira está longe de ser revertida

NELSON BRASIL DE OLIVEIRA é vicepresidente da Associação Brasileira da Indústria de Química Fina (abifina)