terça-feira, 27 de julho de 2010

A arte de ensinar e aprender

Agregar valor aos profissionais de farmácias e drogarias é o principal objetivo dos treinamentos que a indústria oferece. Ação é tida como estratégia de marketing. Possibilita excelência no atendimento do varejo, além de crescimento em vendas
Por Lígia Favoretto


Sempre tão distantes um do outro, indústria e varejo passaram a buscar alternativas de aproximação. No mercado farmacêutico, estreitar relacionamentos é uma atitude fundamental. Nessa ligação todos saem ganhando, já que o valor adquirido com a troca de experiências é inestimável. Hoje em dia a indústria consegue chegar ao ponto de venda prestando um serviço diferenciado. Na proposta de parceria, clientes em potencial são beneficiados com treinamentos customizados, o que agrega valor, com conteúdo, um dos principais objetivos. "Oferecer treinamento é uma ação promocional, dentro das ferramentas estratégicas de marketing de uma empresa", afirma o gerente nacional de treinamento do laboratório Teuto, Claudio Louzada. O profissional administra essa área há aproximadamente dez anos e revela que o laboratório atende cerca de 15 mil pessoas anualmente, em todo o Brasil. Existe um calendário promocional que sinaliza a demanda e a prioridade de relacionamento dos clientes. "Nossa intenção é clara: levar conteúdo aos funcionários de farmácias e drogarias, sejam eles balconistas, farmacêuticos, consultores de vendas, caixas, gerentes, gestores e até mesmo os proprietários. Claro que falamos da empresa e de nossos produtos, mas 80% da apresentação do treinamento é conteúdo", diz. Segundo Louzada, quando a indústria chega ao ponto de venda cria-se um relacionamento muito interessante. "O canal farma quer saber sobre particularidades do laboratório e o laboratório percebe a realidade do varejo, só que nesse caso não mais somente por ouvir falar, mas por estar próximo. Dessa maneira, a chance que ambos passam a ter de agir, de melhorar e evoluir é muito mais rápida", comenta. O laboratório EMS, por meio da divisão EMS Genéricos, também percebeu essa demanda de mercado e está presente no ponto de venda com treinamentos para profissionais do setor. No ano de 2009 a empresa se estruturou e lançou dois projetos: o Academs e o Portal nafarmacia.com.br. De acordo com o diretor de marketing da divisão EMS Genéricos, Marco Aurélio Miguel, o Academs é um projeto de consultoria e capacitação profissional por meio do qual quatro consultores qualificados realizam pessoalmente os treinamentos a profissionais do setor e consultoria a proprietários de drogarias. "Os temas vão desde gestão de pessoas, gestão de estoque, rotinas administrativas, financeiras, técnicas de negociação, até gestão de categoria e posicionamento do negócio", revela Miguel. Para o diretor, oferecer treinamentos é uma maneira de aproximar a marca aos profissionais do segmento e contribuir com a qualificação do setor. "Normalmente organizamos os treinamentos em hotéis. Nosso objetivo imediato não é o crescimento das vendas, mas mostrar que o laboratório é uma empresa estruturada, o que possibilitará maior segurança em relação à eficácia de nossos medicamentos", explica. Marco Aurélio Miguel finaliza informando que o investimento do laboratório em treinamento é alto. Em torno de R$ 5 milhões, fatia considerável quando se compara ao faturamento total da empresa, que em 2009 foi de R$ 2,45 bilhões. Demanda de conteúdo O Teuto apresenta a grade de temas ao ponto de venda que receberá o treinamento, para que os gestores do canal de vendas escolham o que melhor se enquadra à realidade da farmácia. "Nossos treinamentos são compostos basicamente por temas que abordam a questão do atendimento, a excelência em vendas, as vendas sazonais e algumas doenças específicas, como as do trato digestivo, por exemplo", conta Claudio Louzada. De acordo com o especialista, os módulos de conteúdo do Teuto são planejados anualmente e sofrem alterações devido às normas e legislações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que mudam constantemente. "Temos de ter a preocupação de nos informar e trazer as novidades para a prática, com exemplificações e relatos de casos possíveis de ser vivenciados no dia a dia das farmácias", diz. De treinamento em treinamento é possível sentir especificidades dos funcionários. Quando isso acontece, Louzada procura dar uma nova "roupagem" ao tema. O coordenador de treinamentos do Teuto revela que o tema mais pedido pelas redes é o de atendimento, já que quando prestado com qualidade os clientes ficam mais satisfeitos e, consequentemente, retornam à mesma loja para comprar mais. Perfil dos participantes A maioria das pessoas que recebe o treinamento está participando pela primeira vez. Louzada explica que quase sempre os funcionários são convidados por seus gestores. Muitos deles fazem o convite em cima da hora, o que leva os colaboradores a encarar a presença como algo obrigatório. "Falta um pouco de comunicação nesse processo", critica. O treinamento Teuto acontece de uma a duas vezes por ano nas redes parceiras. "Normalmente quando estamos em uma rede, os proprietários reúnem um certo número de funcionários de todas as lojas, em um local predeterminado, em dois turnos, manhã e tarde, já que o ponto de venda não pode ficar desfalcado", diz. Na maioria das vezes as redes não dispõem de local específico para realizar o treinamento, nesse caso, é reservado um espaço dentro da própria loja. "Como alguns assuntos são muito técnicos, nós tentamos transformar a linguagem rebuscada em termos mais simples. Brincamos que precisamos falar a língua do "balconês", conta Louzada. Quem presta o treinamento precisa preocupar-se também com a didática e a qualificação pessoal. A equipe do laboratório Teuto, composta por Louzada e duas farmacêuticas, passa constantemente por aulas de recursos metodológicos, vivência e neurolinguística. Percepção aflorada As redes de farmácias e drogarias começaram a se preocupar mais com o desenvolvimento de seu pessoal. Segundo informa Claudio Louzada, do Teuto, a velocidade das mudanças do mercado como um todo e a percepção do nível concorrencial deixam os gestores em alerta e com o desejo de investir em treinamento, o que soma diversos benefícios, como a reciclagem do conhecimento da equipe da farmácia, e até um resultado positivo no aumento das vendas. "Os funcionários do varejo farmacêutico são muito jovens, a maioria deles não está no balcão há muito tempo. O treinamento faz com que eles conheçam todos os detalhes do setor, bem como dos medicamentos, para poderem se aprofundar e se desenvolver", explica. Louzada conta que no passado muitos laboratórios chegavam às lojas com um treinamento disfarçado. "O objetivo dessas empresas era na verdade abrir portfólio. Isso gerou um afastamento. As redes não gostam disso, elas querem clareza nas intenções", revela. Eficiência do treinamento Os treinamentos são mais eficazes quando o próprio laboratório fala ao ponto de venda. Os resultados não são só para as farmácias, mas também para os laboratórios. A farmacêutica e supervisora de treinamento do laboratório Teuto, Magali Tamas, afirma que é possível ganhar e muito em credibilidade. "A imagem do laboratório fica associada ao desenvolvimento que aquele profissional teve. Ele passa a se sentir importante porque sabe que nós chegamos até ele. Isso melhora o relacionamento entre todos os parceiros do canal", diz. Além disso, a farmacêutica revela que a marca da empresa fica na cabeça da pessoa que recebeu o treinamento, o que possibilita a recomendação de um medicamento do laboratório na hora da venda. "O que nos difere concorrencialmente", enfatiza Magali. No que diz respeito a custos, estes são só para os laboratórios. "No nosso caso, distribuímos materiais como ficha de avaliação, caneta, crachá, pastinha, além de oferecermos um coffee-break", conta Magali. O treinamento na prática Sob o lema "Você quer vender muito ou vender mais?", Claudio Louzada, do Teuto, iniciou no último mês o treinamento para os funcionários da Rede Leste, uma rede familiar de farmácias e drogarias da zona leste de São Paulo (SP). Estavam presentes aproximadamente 40 pessoas, entre balconistas, farmacêuticos, gerentes e caixas, além de dois proprietários da rede composta por 30 lojas: Edson e Thiago Sansana. A turma de participantes interagiu o tempo todo com Louzada, fazendo perguntas e apresentando situações corriqueiras da rotina profissional. O tema escolhido pela rede foi "Atendimento que aumenta vendas". O Guia da Farmácia acompanhou tudo e registrou as dúvidas mais frequentes. Alguns balconistas da Rede Leste falaram que muitos clientes questionam sobre a proibição da venda da sibutramina. Louzada explica que o que se ouve hoje é que a substância não pode mais ser vendida, mas a realidade não é essa. "Ela nunca pôde ser vendida, é necessário receita médica", diz aos participantes. Outro ponto levantado foi quanto a saber o risco que um medicamento errado pode causar à população. Magali Tamas explicou que é preciso ajudar o paciente a entender direitinho o que o médico receitou e fazer a correta dispensação. "O que se almeja são as vendas de qualidade, com consciência e responsabilidade." Houve ainda questionamentos sobre a RDC 44 e a queda da patente do Viagra. Os funcionários contam como foi a adaptação às novas normas e como eles próprios passaram a auxiliar os clientes. Redes investidoras Proprietário de uma das lojas da Rede Leste, Edson Sansana diz que normalmente o treinamento é planejado com 20 dias de antecedência; os gestores fazem uma análise para saber quantos funcionários estão em férias ou em folga, para que seja definida a melhor data. "Nosso objetivo, ao investir em treinamento, é melhorar o nível de nossos funcionários e otimizar as vendas. Um funcionário fica apto a inverter por exemplo, a venda de um medicamento ético por um genérico, com responsabilidade. Os resultados em aumento de vendas vêm a longo prazo. Nós precisamos de treinamento de laboratórios que falem dos princípios ativos e não daqueles que ensinam somente a vender o produto do próprio laboratório", fala Sansana. A farmacêutica e gerente da Rede Leste, Bruna Domingues, participou pela primeira vez de um treinamento Teuto. "Com o treinamento nós passamos a ter mais confiança nos medicamentos do laboratório e consequentemente ficamos aptos a prestar melhor orientação aos pacientes", conta. Já Samuel Lacerda Favatto, balconista da mesma rede, participou de cinco treinamentos e acredita que a confiança que o laboratório passa é a mesma que o funcionário conseguirá repassar aos clientes. Silvio Lopes da Silva, proprietário da unidade Farma & Cia na zona leste da capital paulista, repete os treinamentos em sua loja de 20 a 30 dias já que, segundo ele, os funcionários não conseguem absorver 100% do que é falado no curso de uma única vez. "Em 12 meses de investimento em treinamento foi possível calcular 20% de crescimento nas vendas da farmácia", revela Silva. O executivo conta que ele também participa, para que todos os colaboradores se sintam motivados. "Essa motivação é percebida na hora da venda. Se um cliente pede um curativo, por exemplo, o balconista passa a oferecer também um antisséptico. O que gera vendas agregadas", finaliza. Poupafarma, rede de farmácias e drogarias, tem 40 lojas localizadas na baixada santista, litoral de São Paulo, na capital e no interior. Possui uma área exclusiva de treinamento e desenvolvimento, sob coordenação de Lygia Moraes. Além da parceria com fornecedores, a empresa realiza treinamentos próprios, específicos para a formação e provimento de aperfeiçoamento técnico-operacional. O laboratório Teuto desenvolveu, certa vez, um treinamento específico para a Poupafarma, sobre negócios e empreendedorismo, aplicando um jogo de negócios bastante apreciado pelos colaboradores participantes.

Fonte: Guiadafarmacia